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terça-feira, 1 de novembro de 2011

Bastava-nos uma Democracia

Vem esta questão a propósito do Post anterior em que defendi ser uma injustiça as subvenções vitalícias de ex-políticos, independentemente de estarem ou não no ativo.

Ora, a métrica para levar alguma justiça a estes casos foi revista pelos nossos governantes:

As indemnizações por despedimento passam, a partir desta terça-feira, de 30 para 20 dias com um tecto máximo de 12 salários.

Assim, depreende-se que a existência de tectos é um conceito trivialmente aplicável… mas apenas para alguns – o que significa que, uma vez mais, os políticos, os mercados (os seus temerários intervenientes) e a ambição desmedida, bem doseada pelas duas partes, apenas admite certos conceitos para os mais fracos e expostos (novamente a velha história de ser forte… com os fracos).

O que é que tudo isto tem a ver com ex-políticos com subvenções vitalícias? Atendendo a que é uma situação que se reveste de especial injustiça social gritante, os atuais políticos poderiam aplicar esta métrica – 20 dias por ano até um máximo de 12 salários para aqueles que estivessem efetivamente desempregados. Depois disso, é tratar de vida, como qualquer português…

Ainda assim poder-se-á invocar a ilegalidade da aplicação de tal regra a ex-políticos uma vez que não tem efeitos retroativos. Existem, porém, dois aspetos preponderantes que aconselhariam anular, com efeitos imediatos, as subvenções dos ex-políticos que já tivessem excedido os “12 salários”: o primeiro seria acabar com uma regalia socialmente digna de ignomínia – tanto para os que criaram tal regra, como para os que dela pacificamente beneficiam. Em segundo lugar, os trabalhadores portugueses estão objetivamente confrontados com a eliminação concreta de privilégios adquiridos (por exemplo, a perda, pura e simples de 2 dos 14 meses de ordenado). Novamente, invocando, então, a injustiça da atual situação e a perda de direitos que hoje é implementada em nome da crise, acabem lá com todas as subvenções vitalícias. Os ex-políticos que recebam os subsídios de desemprego nos moldes de qualquer outro cidadão português.

A existência de leis privilegiando uns grupos em detrimento de outros, para os quais a legislação é acentuadamente mais dura, é a prova cabal de que não vivemos numa democracia. As democracias como tal não existem. Restrinjo-me ao meu país, mas o conceito é espontaneamente generalizável: Hoje em dia somos dominados por pequenos grupos de pessoas (as elites de 2 ou 3 partidos) que gerem a nação, emitindo discursos com mensagens de competitividade ou necessidade de resolução de problemas graves – em função do ciclo económico – mas cuja verdadeira ação visa, apenas, ajustar a existência do próprio país às regras de mercados poderosíssimos onde a ética é explícita e diariamente ridicularizada, sendo que, para isso, sacrificam todos aqueles que não têm poder de decisão (o voto representa 1%, se tanto, da capacidade de decisão popular numa verdadeira democracia) e salvaguardam-se a si próprios pois, sabendo que cedo ou tarde serão banidos pelo povo, criam as condições legais (embora, naturalmente imorais), para que possam singrar no período pós-político… atribuem-se cargos altamente remunerados em empresas tuteladas pelo ou com forte ligação ao próprio estado, blindando-se com indemnizações astronómicas no caso de despedimento.

Apesar de confessar a minha dificuldade em conceber de forma razoavelmente completa uma democracia eficaz, acredito profundamente que Portugal não o é. Somos um país em que a governação não obedece a princípios de eficiência, otimização e equilíbrio. Somos um país em que os governantes se decidem em corredores a que muito poucos têm acesso; e os mais espertalhões em conversas de corredor muito improvavelmente serão os mais aptos para gerir com acerto a nação: mas serão estes os governantes que teremos, uns após os outros. Acredito que este raciocínio é significativamente generalizável ao mundo em que vivemos.

As democracias necessitam, atualmente, de um salto qualitativo muito importante, de forma a subjugar interesses de mercado e financeiros aos conceitos de qualidade de vida e maior igualdade.

Termino com uma referência da Wikipédia sobre a democracia romana: “As assembleias populares (…) eram locais de discussão política e deliberação. Todos os cidadãos romanos podiam participar delas e votar. Nessas assembleias, os votos eram contabilizados por grupos; por exemplo, na assembleia centuriata, os romanos votavam em grupos diferenciados por propriedade, o que garantia que os ricos tivessem mais poder de decisão que os pobres.”

Finalmente, apesar de todos os cidadãos romanos poderem votar, nem todos eram considerados cidadãos romanos.